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Boticário lança programa para empreendedores diversos: 'Não é romantismo'

Boticário e Sebrae lançam programa para acelerar negócios diversoseee - Divulgação
Boticário e Sebrae lançam programa para acelerar negócios diversoseee Imagem: Divulgação
do UOL

Clara Assunção

Colaboração para o UOL, em São Paulo (SP)

30/05/2025 11h30

Em um momento em que pautas de inclusão e sustentabilidade perdem destaque em grandes empresas, o grupo Boticário lança um programa gratuito de aceleração voltado exclusivamente a empreendedores de grupos sub-representados: mulheres, pessoas negras, pessoas da comunidade LGBTQIA+ e pessoas com deficiência. A iniciativa da quinta maior companhia do país no ramo de farmacêuticas e cosméticos, realizada em parceria com o Sebrae, reforça a aposta na diversidade como vetor de desenvolvimento econômico.

Como funcionará

O Programa de Aceleração de Negócios Diversos vai selecionar até 20 micro e pequenos negócios. Para participar, a empresa deve ser de propriedade de pessoas diversas: 51% ou mais do negócio controlado por mulheres, pessoas negras, pessoas LGBTQIA+ ou pessoas com deficiência e ter um faturamento de até R$ 4,8 milhões, no limite do Simples Nacional.

Como critério de seleção, serão escolhidas as empresas com sede na Bahia, Paraná e em São Paulo. Para essa primeira edição, o grupo Boticário optou por limitar a participação às localidades onde tem fábricas e centros de distribuição. Serão aceitas, contudo, as inscrições de pequenos negócios de todos os ramos, desde que preencham os demais critérios de seleção.

Os escolhidos terão o, entre setembro de 2025 e março de 2026, a um ciclo de capacitação. O acompanhamento inclui mentorias com especialistas do Boticário e Sebrae, assim como workshops e trilhas formativas com foco em gestão, inovação e o a crédito. As inscrições foram abertas nesta sexta-feira (30) e poderão ser realizadas até 20 de junho por meio do site do programa.

Diversidade para destravar novos negócios

A iniciativa parte de um diagnóstico claro: embora representem parcela significativa da população, esses grupos ainda enfrentam barreiras para empreender com competitividade no Brasil. "Se o cenário já é desafiador para todos os brasileiros, imagine para aqueles brasileiros que já largam um pouco atrás por conta de marcadores sociais importantes", observa o gerente sênior de ESG Diversidade e Inclusão do grupo Boticário, Rony Santos.

Hoje, o o ao crédito, fomento, desenvolvimento de produtos, e, depois à abertura do mercado, porque não basta só ter o o ao crédito, o produto precisa estar com o mercado aberto, tudo isso fica muito mais difícil se você pertence ao grupo de diversidade, então o desafio é imenso
Rony Santos, gerente sênior de ESG Diversidade e Inclusão (D&I) do grupo Boticário e professor universitário

No caso das mulheres, embora sejam mais da metade da população, elas ainda não são maioria no empreendedorismo. O número de empreendedoras vem aumentando e chegou a ser 42% maior em 2024 em relação a 2012, primeiro ano do estudo feito pelo Sebrae e IBGE. Mas elas representam 34,1% do total que vivem da renda obtida pelo próprio negócio e ganhavam, em média, R$ 2.867 - valor 24,4% mais baixo do que os homens.

Desigualdade na formalização. A diferença era ainda maior entre mulheres pardas e pretas. A renda delas é de cerca de R$ 2 mil, conforme dados do Instituto Rede Mulher Empreendedora. Entre 2013 e 2023, o número de empreendedores negros no Brasil cresceu 22%, superando o crescimento de donos brancos, de 18%. Mas a proporção de empresários com CNPJ, de acordo com dados do Sebrae ainda era de 18,6 pontos percentuais maior entre os empreendedores brancos do que em relação aos pretos e pardos.

Já no caso das pessoas LGBTQIAP+, o instituto mostrou neste ano que 3,7 milhões que já lideram o próprio negócio no país. Isso é o equivalente a 24% dos 15 milhões de brasileiros com 16 anos ou mais e que se identificam como pertencentes a uma das siglas. Mas a pesquisa também mostrou que as pessoas que não fazem parte da comunidade LGBT+ tendiam a ser mais otimistas em relação às chances de sucesso do empreendimento.

Brasil tem 18,6 milhões de pessoas com deficiência, mas o total de empreendedores desse grupo é desconhecido. Não há dados oficiais sobre a quantidade de pessoas dessa parcela da população que vivem da renda do negócio próprio. Mas as notícias sobre o mercado de trabalho como um todo dão indícios das dificuldades: 84% dessas pessoas não ocupam cargos de liderança, segundo estudo dos institutos Talento Incluir, Locomotiva, Pacto Global e iO Diversidade.

Rony Santos, gerente sênior de ESG Diversidade e Inclusão (D&I) do grupo Boticário - Divulgação - Divulgação
Rony Santos, gerente sênior de ESG Diversidade e Inclusão (D&I) do grupo Boticário e professor universitário
Imagem: Divulgação

Esse projeto a longe de romantizar o empreendedorismo, porque empreender é difícil e exige resiliência, planejamento, consistência, equilíbrio e previsibilidade, o que nem sempre temos em nosso país. E quanto mais grupos de diversidade você pertencer, maiores serão também os desafios. Uma mulher tem desafios, mas uma mulher negra tem ainda mais, se tiver deficiência mais ainda e será assim com outras interseccionalidades.
Rony Santos, um dos responsáveis pela iniciativa

Onda anti-ESG e diversidade não afeta inclusão

Diversidade como uma estratégia. Embora o Grupo Boticário afirme que sua marca de diversidade e empreendedorismo remonte aos anos 1980, a estratégia de diversidade ou de fato a ser incorporada pela companhia mais recentemente, em 2019. De lá para cá, segundo o gerente de ESG e D&I, a empresa vem expandindo seu olhar para além da inclusão nas equipes internas para ter foco também na inclusão em cadeias de valor.

Atualmente, 11% do gasto total com fornecedores estratégicos da companhia já está direcionado a empresas lideradas por pessoas diversas. Isso teve início com a criação do Portal de Compras Afirmativas, em 2022, que conecta empreendedores diversos à rede de fornecimento da companhia. Hoje, mais de 1.300 empresas estão cadastradas na plataforma, com um crescimento de mais de 30% apenas em 2024.

Essa jornada levou a companhia a identificar os desafios enfrentados por pequenos empreendedores. Com base nesses aprendizados e na intenção de ir além de ações pontuais de impacto social, surgiu a ideia do novo Programa de Aceleração de Negócios Diversos.

Fortalecimento econômico, aliado à educação, é ferramenta para transformação social. "Empreender pode ser o que permite que uma mulher saia de uma relação de violência doméstica, ou que uma pessoa com deficiência conquiste autonomia diante de um ambiente familiar hostil. O impacto disso na promoção da dignidade humana é imenso", afirma.

Internamente, o grupo também monitora metas internas de inclusão. Oito em cada dez colaboradores da empresa fazem parte de grupos de pessoas diversas, e há metas específicas tanto para equipes quanto para lideranças. Os compromissos incluem também o desenvolvimento de produtos inclusivos - com atenção à ibilidade, linguagem clara e usabilidade - e campanhas publicitárias com representatividade na frente e atrás das câmeras.

Essa atuação ganha ainda mais destaque em um momento em que grandes corporações nos Estados Unidos têm recuado publicamente de suas metas de diversidade, em meio a uma onda anti-ESG. O gerente do Grupo Boticário ressalta que o contexto brasileiro é distinto do norte-americano. Aqui, há legislações que impulsionam a inclusão e um histórico de desigualdade racial e econômica que torna urgente a atuação das empresas.

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